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ABRAÃO METE-SE AO CAMINHO
 E RECEBE A PROMESSA DA TERRA
 


Génesis 12, 4-9

 

Nicoletta Crosti

 
Em poucas linhas, o autor faz sobressair a fé de Abraão e introduz os acontecimentos que se seguirão.
 
v. 4a Então Abraão procedeu tal como havia dito o Senhor
Abraão sem delongas e sem duvidar da palavra do Senhor mete-se a caminho; põe em prática a palavra recebida, e fá-lo porque tem confiança em Deus. Abraão é o homem da fé pronta e nua e totalmente consagrado à missão recebida. Por isso Abraão é o anti-Adão, que dá origem a uma história nova e a um homem novo que se completará em Cristo. Por esta sua obediência, a bênção de Deus estender-se-á a todas as famílias da Terra (Gn 26,5). Tiago recordará estas obras de Abraão (Tg 2,14-24) e também Paulo (He 11,8).
 
v. 4b Abraão tinha setenta e cinco anos. É já um homem sábio e inteligente que, não obstante a sua idade, está pronto para arriscar a sua vida e a da sua família para seguir a voz de Deus.
 
A vida de Abraão vem apresentada como a vida simples e livre dos semi-nómadas, que permanecem temporariamente onde há água e pasto, não possuem a terra, vivem da precariedade da estepe.
 
A peregrinação de Abraão é querida por Deus (Js 24,2-3) e para o autor é metáfora da “viagem santa” constante do Salmo 84/83 (v. 1-8), (suspira e tem sede da casa de Deus)
Abraão é modelo de todo o caminho da fé, vivido na escuta da palavra de Deus e em total obediência à voz interior.

Isto significa aceitar a precariedade, superar os obstáculos e sentir-se estrangeiro e hóspede (Lv 25,23) no que respeita à comunidade dos homens. Tema este que é retomado por Jesus a propósito dos seus discípulos. Esses não são do mundo, como eu não sou deste mundo (Jo 17,16).

vv. 4-5 Abraão foi ... saiu de Canaã… saíram para ir. Ir e sair, são dois verbos ligados ao chamamento de Adonai (Gn 12,1) e à espiritualidade do Êxodo (Ex 3,10). O “ir” é sempre uma saída de; no caso específico de Abraão, é sair de um mundo idólatra.

v. 6 até ao lugar de Siquém, junto do carvalho de Moré. Siquém, subúrbio da actual Nablus, era uma cidade-estado antes dos israelitas, depois tornou-se o santuário mais importante de Israel, mas nunca se transformou num santuário completamente israelita. Era o santuário Cananeu de El-Berit ou Baal-Berit, o deus do pacto, onde Josué fará renovar o pacto às tribos de Israel (Js, cap. 24).

O carvalho é uma das árvores «cósmicas», às quais os antigos davam uma imensa importância. Uniam os infernos ao céu, sustinham e mantinham a vida no Cosmos. O carvalho de Moré é até citado no Gn 35,4 e Js 24,26.

v. 7a O Senhor apareceu a Abraão e disse…É a primeira aparição bíblica de Adonai (a tradução literal transcreve deixou-se ver). Tal como agora se faz nos lugares onde ocorreram aparições, Abraão faz construir ali um lugar de culto. Nos tempos antigos, com efeito, a presença do transcendente transformava o lugar num centro cósmico, onde o céu encontrava a terra.

v. 7b à tua descendência eu darei esta terra. A posse da terra era um sonho dos semi-nómadas. Significava para eles o fim das migrações sazonais, com todos os perigos que aquelas comportavam.

É esta a grande promessa da terra, que virá repetida em Gn 13, 14-15; 15,7; 17,8; 26,3; 35,12; 50,24.

Israel recebe esta terra como lugar no qual vai pôr em prática todas as leis do Senhor (Lv 20,22-24 e 26; Dt 11, 31- 12,1). Isto tornará a terra santa, porque habitada por santos: e por consequência tornar-se-á terra onde corre leite e mel (Ex 3,8; Dt 26,9), isto é, onde o homem encontra a plenitude da felicidade e da prosperidade. Condição para manter a terra santa é reconhecê-la sempre como dom de Deus (Dt 26,1-11), permanecendo fiel a Adonai e só a ele servindo. Esta condição não será respeitada pelos hebreus que, após o esplendor de Salomão, foram exilados para a Babilónia.

Na tradição bíblica a terra permanece sempre e só de Deus (Lev 25,23). É assim com a terra prometida; ao homem e aos israelitas é dado somente o usufruto da terra.

O autor separa a promessa da descendência (v.1) da promessa da terra (v. 7), para sublinhar a fé de Abraão, que se põe em marcha sem conhecer o futuro e sem pensar numa recompensa. As duas promessas seguem repetindo-se aos pares (Gn 13,15-16 e 17, 4-8). O futuro das duas promessas é remoto, reporta-se ao eu indicar-te-ei ... eu dar-te-ei esta terra. Abraão não verá quase nenhuma da sua numerosa descendência, nem a posse da terra, mas continuará a crer nas duas promessas. Abraão só possuirá um campo que comprará para a sepultura da sua mulher, Sara (Gn 23,16-20; 25,10; 50,13).

Sobre a terra aqui mencionada, nascerá, crescerá, será crucificado e renascerá o hebreu Jesus, o filho de Deus, o homem Santo por excelência, que a santificará de modo novo e perene.

v. 8 construí um altar. Segundo o autor, pela primeira vez, num ponto preciso da terra, um homem, escolhido por Deus, constrói ao Deus único, criador do céu e da terra, um lugar de culto onde se pode evocar o seu nome. Passaram muitos séculos antes de chegar a construção do grande templo de Jerusalém. O altar construído por Abraão era provavelmente um monte de simples pedras.

Abraão é apresentado como um homem muito religioso, que tocará todos os santuários da terra de Canaã e os santificará, porque ao lado dos altares pagãos construirá um altar ao Deus único, Senhor de Israel e de todos os povos.

   
 

Tradução: Ana Luísa Teixeira

   
 

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