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O Senhor Ajuda Quem Procura a Justiça

 

Génesis, capítulo 38

 

Nicoletta Crosti

 

O episódio de Judá e Tamar, narrado neste capítulo, é exterior à história de José. Foi aqui incluído de propósito, numa data posterior, para lembrar que, na história da salvação, a primazia entre os filhos de Jacob, não é de José, mas de Judá (ver Génesis 49,8-12), no que respeita à linhagem davídica e portanto do Messias.

vv. 1-6 Naquele tempo, Judá separou-se dos irmãos …São narrados os antecedentes necessários para se perceber o facto: Judá parece ter deixado a zona montanhosa de Efraim para chegar à planície cananeia. Como consequência, Judá casa com uma cananeia e o mesmo fará o seu primogénito.

v. 7 Mas Er, o primogénito de Judá, era mau aos olhos do Senhor que fez com que ele morresse. A morte prematura de Er é lida pelo autor como "castigo de Deus". Uma vida longa era uma expressão da bênção de Deus.

v.8 Então Judá disse a Onan: aproxima-te da mulher do teu irmão, cumpre o direito de levirato e assegura assim uma descendência ao teu irmão. O costume do levirato, segundo o qual uma mulher que enviuvasse sem filhos homens, deveria ser dada como esposa a um cunhado ou a outro membro da família, era baseado numa lei. (Dt 25,5-6). No Antigo Testamento este costume encontra-se referido aqui e no livro de Rute (cap.3-4). Recordam-no, também, os evangelistas (Mt 22,24; Mc 12,19; Lc 20,28). O levirato era um direito da viúva e um dever dos irmãos do marido. Quem se recusava a cumprir este dever era punido. (Dt 25, 7-10). Esta norma foi criada não só para conservar na família o património, do qual a mulher era parte integrante, como também para proteger as jovens viúvas sem filhos contra as restrições económicas e da marginalização social. De facto, a viúva era a mais pobre dos pobres, uma vez que não pertencia a ninguém, nem ao próprio pai de quem se tinha separado para se casar, nem a um marido, alem de se tornar refém dos parentes que lhe exigiam o que quer que fosse. Por isso Deus é duríssimo contra quem maltrata as viúvas (Ex 22,21).

v. 9-10 Mas Onan derramava no chão o sémen …Onan sabia que o filho não seria considerado como seu, mas como filho do irmão que tinha morrido, e sabia que ficaria com a herança devida ao primogénito. Por isso decide dispersar o esperma, uma falta de solidariedade com a cunhada.  O onanismo era considerado um pecado gravíssimo porque correspondia ao matar da vida; era contrário ao primeiro mandamento da Torah “sede fecundos e multiplicai-vos” (Gn 1,28).  Por isto o Senhor faz com que Onan morra. Veja-se Lv 15,16-18, o homem que tenha uma emissão seminal é imundo.

v. 11 Retorna a casa do teu pai …Judá  comporta-se de modo incorrecto, deveria manter   Tamar na sua casa e depois dá-la ao filho Chelà.  Mas Judá teme perder também o seu último filho e arranja o pretexto da sua jovem idade.

vv. 12  Enquanto isso Judá fica viúvo e não se interessa mais por Tamar.

vv. 13 Quando Tamar vem a saber que Judá se aproxima da sua casa para tratar dos seus  assuntos, e sentindo-se traída por não ter sido dada como esposa a Chelá, para conseguir obter justiça, tece uma armadilha. Por outro lado, segundo a lei do levirato, Judá tendo ficado viúvo deveria desposar Tamar.

v. 14 Então Tamar depôs as vestes de viúva e cobriu-se com o véu …Tamar urde a sua trama vestindo-se como uma mulher casada.

vv. 15-16a Judá viu-a…não supunha, de facto, que fosse a sua nora …Judá sendo viúvo podia ir às prostitutas, era até uma acto normal pelo que se ofereceu à mulher.

vv-17-19 Esta disse: que me darás…? Dá-me um penhor…o teu selo, o teu cordão e o bordão. Tamar é muito astuta, é ela que corajosamente estabelece os termos da transacção. Pedindo um penhor,  pode prender Judá, no caso de ficar grávida.

Segundo o autor, Judá, que traiu o seu irmão José (Gn 37, 26-27), é por sua vez agora traído..

Na história da salvação pagam-se as maldades.

vv. 20-23 Judá manda o cabrito como combinado, mas não mais se encontra com a prostituta, da qual ninguém sabe.  A palavra prostituta aqui usada indica a ‘prostituta consagrada’. Era um costume cananeu; eram mulheres que por voto se entregavam a um estranho, como sacrifício da própria castidade.  Costume condenado no Deuteronómio (23,18-19) e em  Oseias (4,12-14).

vv. 24 Tamar a tua nora está grávida pelo seu meretrício… trazei-a para que seja queimada! Judá de facto não a considerva mais como nora, tinha-a injustamente mandado para casa. Mas perante as outras pessoas permanecia como nora e o seu meretrício era uma vergonha inadmissível. É por isso que a reacção de Judá é violenta.

vv. 25 Tamar envia agora secretamente os penhores recebidos de Judá para o fazer perceber que foi ele quem a engravidou. É uma atitude delicada feita de modo privado para não fazer enfurecer mais o sogro.

v. 26 Judá disse: essa é mais justa do que eu porque não a dei a meu filho Chelá. Judá tem a coragem e a humildadde de declarar o seu pecado e de mostrar a inocência de Tamar. O mesmo fará  David (2 Sm 12,13) e Deus lhes perdoará. Judá retomará  Tamar junto a si como nora e por isso não mais terá relações sexuais com ela.

Judá  não é um herói mas um homem comum, um pecador , como Abraão  (Gn 12,18-19), como Jacob (Gn 27,19), como David. De facto, os autores do Antigo Testamento insistem em dizer que

A história de Israel não é conduzida pelos heróis, como as histórias pagãs, mas pelo próprio Adonai através das misérias dos homens.

vv. 27-30 Tamar gera dois gémeos: Peres e Zera. Peres é o antepassado de David através de  Booz, o marido de Rute, cuja história é muito semelhante à de Tamar. Retoma-se o tema do “menor” escolhido por  Adonai para o seu plano de salvação.

O autor apresenta Tamar como uma personagem muito positiva, porque demonstra fidelidade à família do marido e tenta dar-lhe uma descendência. Tamar entende concretamente qual é a vontade de Deus e realiza-a. Pode dizer-se que é uma matriarca.

 

Tradução: Ana Luísa Teixeira

   
   
 

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