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Os Irmãos de José Reconhecem a sua Culpa

 

Génesis, capítulo 42

 

Nicoletta Crosti

 

A história de José continua e anima-se. Ocorre uma mudança de perspectiva em relação ao capítulo anterior. Retoma-se o tema fundamental da história, que é uma história de irmãos e da sua relação (vd. capítulo 37). O termo irmãos aparece repetido frequentemente. Veja-se Mt 23,8: Não vos deixeis tratar por mestre (...) vós sois todos irmãos.

vv. 1-2 Jacob disse aos seus filhos (...) há trigo no Egipto. Ide lá comprá-lo para que continuemos vivos e não morramos. Repare-se na figura de Jacob, homem de acção, que quer que os filhos sejam homens responsáveis e enfrentem a penúria. Será este sentir-se responsável que permitirá a Adonai mostrar-se como o Deus da vida numa situação de morte. O Egipro era o celeiro do mediterrâneo, especialmente para a Palestina em tempo de carência.

v. 4 Jacob quer ter consigo o filho Benjamim, o último filho da  esposa que já não existe. Teme perdê-lo, como já acontecera com José.

v. 6 Ora José tinha autoridade no país (...) os irmãos prostraram-se diante dele.

Os irmãos não sabem que, de facto, estão a realizar os sonhos do c. 37 (vv.6-10).

v. 7-8 José vê os seus irmãos e reconhece-os, mas mostra-se estranho. Por duas vezes se diz que José reconhece os irmãos, mas estes não o reconhecem. É uma técnica narrativa muito comum, esta de ter dois personagens que não conhecem a situação, enquanto o leitor a conhece. Isto cria uma expectativa no leitor que espera poder ver acontecer esse reconhecimento. José quer levar por diante um plano que permaneça, porque, por um lado, não quer aproveitar-se da humilhação dos irmãos, que por causa da fome se prostram diante dele, mas, por outro lado, quer uma reconciliação profunda e verdadeira dos irmãos com ele.

v. 9 José (...) dise-lhe: vós sois espiões!  José acusa-os do delito de espionagem, uma acusação gravíssima. Ao leitor, isto aparece como um comportamento sádico, mas na realidade faz parte de um plano preciso e que visa o bem.

vv. 10-11  Eles responderam: não senhor, os teus servos (...) nós somos todos filhos de um único homem. Os irmãos apresentam-se com muita humildade, dizem-se servos e refutam a acusação, fazendo notar que são todos irmãos de uma mesma família. Não é, pois, verosímel que venham  mandados como espiões dez irmãos em conjunto.

v. 12 José insiste porque quer fazê-los falar da família

v. 13 (...) o mais novo ficou junto do nosso pai e um outro já não existe. Os irmãos respondem, mas de modo demasiado vago.

vv. 15-17 José disse (...) vós sois espiões. Por isso vos porei à prova (...) vós ficareis prisioneiros. José intimida-os e faz-se de duro, por uma razão precisa: quer pôr à prova a solidariedade entre os irmãos e ver quem fica e quem vai. Quer uma solidariedade maior do que aquela que ocorreu com o irmão vendido como escravo. José quer ajudar os irmãos a arrependerem-se, atitude necessária para receber o perdão (Lc 17, 3-4). Por outro lado, o hebreu sabe que deve prestar contas a Deus do seu empenho em converter os pecadores (Ez 33,8-9; Lv 19,17-18).

Deus não quer a morte do pecador mas quer que se converta e viva (Ez 33,11)

vv. 18-20 José disse-lhes (...) eu respeito Deus (...) um dos vossos irmãos fica prisioneiro e vós parti a levar o trigo (...) depois trazei-me aqui o vosso irmão mais novo. José justifica a mudança de programa com uma razão ética: o respeito a Deus. José não quer retribuir o mal com o mal, não se vinga; pelo contrário, não quer que em casa morram de fome. Por isso decide fazer um único refem.

vv. 21-22 Disseram entre si (...) é certo que sobre nós pesa a culpa em relação ao nosso irmão (...) mas isto vem juntar-se à nossa angústia. Por fim, os irmãos em voz alta, falando entre si, sem saber que José os compreendia, admitiram ter pecado na relação com o seu irmão José. Compreendem que o que lhes acontece depende do seu pecado. Têm pena disso, mas não vêem caminho de saída.

vv. 24-26 Então José comove-se até às lágrimas, porque vê a conversão dos irmãos e, portanto, uma possibilidade de uma autêntica reconciliação. O seu plano teve sucesso. José não impõe aos irmãos uma pena; mas, pelo contrário, oferece-lhes o trigo como gesto de perdão, além de outras provisões para a viagem. O Filho de Deus colocar-se-á nesta mesma linha da gratuidade do perdão, que supera a justiça humana segundo a qual para cada culpa deve corresponder uma pena. Jesus durante a sua paixão continuou a amar os seus perseguidores, mas não pôde dar o seu perdão directamente a nenhum deles, porque nenhum se sentia pecador e o tinha reconhecido. Todavia, sabendo que, dentro de pouco tempo, estaria morto e não poderia mais perdoar, pôs o seu pedão nas mãos do Pai para que ele o desse a quem se convertesse (Pai, perdoai-lhes (...) Lc 23,34). Isso aconteceu aos pés da cruz ao centurião, pagão, responsável directo pela crucifixão, que, inesperadamente, se dá conta de ter agido injustamente, converteu-se, e glorificou a Deus (Lc 23,47).

Sem a conversão do coração não se aceita o perdão e não há verdadeira reconciliação.

vv. 27-28 Restituiram-me o dinheiro (...) Que coisa é esta que Deus nos fez? Para o autor, Deus entra sempre na história dos homens, Deus tinha-os protegido tendo conseguido obter o trigo, mas o dinheiro no saco poderia ser motivo de acusação e os irmãos têm medo.

vv. 29-35 Vêm contar ao pai Jacob toda a aventura e descobre-se que todos os irmãos têm nas suas bolsas o dinheiro restituido.

vv. 36-38  Jacob tem uma reacção infantil, só pensa em si. Ruben descobre que a situação está bloqueada e oferece-se como garantia do irmão, enfrentando frontalmente a situação.

 

Tradução: Manuela Silva

   
   
 

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