Repete-se com Isaac o episódio já
ocorrido com Abraão (Gn 21,22-27); o rei Abimelec quer fazer uma
aliança.
v. 26 Então Abimelec foi
de Gerar ao seu encontro… O rei Abimelec, por sua conveniência,
decide ter boas relações com Isaac, que agora se tornou um vizinho
rico. Para demonstrar a sua deferência faz-se acompanhar de pessoas
importantes.
v. 27 Porque vieram
junto de mim, vós que me odiais e me expulsastes de entre vós?
Isaac está espantado com a visita e põe a claro a contradição do seu
comportamento.
v. 28 Já vimos que o
Senhor (Adonai) está contigo… estabeleçamos uma aliança.
Os Filisteus arrependeram-se de ter expulsado Isaac, pois viram a
bênção contínua que Deus lhe concede. Reconhecem o poder e a bênção
de Adonai, o Deus estrangeiro que está com o seu fiel. Disseram
abertamente: tu és agora um homem abençoado pelo Senhor
(v.29). E por isto querem fazer-se amigos de Adonai através de
Isaac. Os Filisteus não se converteram ao Deus de Israel, mas
reconhecem-no e respeitam-no.
A insistência no verbo ver,
repetido duas vezes no texto hebraico (vendo, tendo visto), é
uma alusão ao tema da “santificação do nome de Deus perante os
Gentios ”. Estes vêem os frutos da santidade de Adonai. De
facto, a santidade de Isaac, que obedece ao Senhor e confia n’ele,
chama sobre si as bênçãos de Deus (Dt 11, 26-28), fazendo
nascer à sua volta uma situação “redentora”. Mas a santidade de
Isaac vem de Deus, e é então Deus que se manifesta através de Isaac.
Na linguagem bíblica diz-se: Deus fez santo o seu nome perante os
Filisteus.
Cada vez que Deus faz
participar os homens e as mulheres da sua santidade, tornando-os
capazes de seguir as suas vias (Lv 22,32; Ez 28,25-26; 36,21-27),
Deus santifica o seu nome.
Esta teologia é retomada por Jesus
na invocação do Pai-nosso, relatado pelos evangelistas (Mt 6,9-13;
Lc 11,2-4). A palavra santificar está no passivo, santificado
seja o seu nome, e foi considerado pelos exegetas um ‘passivo
teológico’, que tem Deus como sujeito. É ele o protagonista, que
todavia necessita da abertura do coração do que crê n’ele para
produzir frutos de santidade (Sl 94/95, 8).
v. 29 Não te fizemos
senão o bem. O estilo diplomático requer esta expressão, que de
facto constitui uma hipocrisia, tendo os Filisteus expulsado Isaac
das suas terras (v.16).
v. 30-31 Então
ofereceu-lhes um banquete… prestaram juramento um ao outro… e
afastaram-se em paz da sua presença. Isaac não hesita em fazer
de imediato a aliança com Abimelec. A aliança é estabelecida de
acordo com os costumes, com um banquete solene que sublinha as boas
relações que agora foram criadas e com os juramentos rituais da
manhã. A aliança convém também a Isaac que tem assim um bom vizinho
numa zona fértil.
v. 32 Naquele próprio
dia … disseram-lhe “encontrámos água”. Continuam as bênçãos do
Senhor. O juramento de paz selado com Abimelec agrada ao Senhor e
começará a fazer parte da história da salvação.
v. 33 Chamou-lhe Chiba; por
isso é que a cidade se chama Bersabé. ‘Chiba’ em hebraico
significa sete, mas não se fazendo aqui nenhuma referência ao número
sete (veja-se pelo contrário em Gn. 21, 28-31), pensa-se que a
vocalização do texto masorético esteja inexacta e que se deva
concluir que significando a palavra shebea ‘juramento’ se
deve interpretar o nome da cidade como “poço do juramento”. Isto
lido na versão grega dos Setenta.
v. 34-35 Estes dois versículos
sobre as mulheres pagãs de Esaù são para relacionar com o v. 46 do
capítulo 27, onde Rebecca exprime todo o seu desapontamento pela
escolha errada deste seu filho. O relato do próximo capítulo, que
trata da bênção de Isaac arrebatada ao seu outro filho Jacob, é
incluído nestes versículos para desacreditar a figura de Esaú, que
não segue a norma hebraica de escolher a própria esposa entre as
hebreias. Norma muito estrita após o exílio da Babilónia no séc. VI
a.C.
ISAAC DÁ A
BÊNÇÃO PATRIARCAL A JACOB
Génesis
27,1-4
O autor utiliza uma saga antiga (a
história desenvolve-se no âmbito estritamente familiar), que mostra
a sagacidade dos antepassados, de Jacob. Na origem, a narrativa
tinha o propósito de exaltar a supremacia de Israel nos confrontos
com Edom, a tribo que lhe era tradicionalmente adversária. Mas aqui
o autor bíblico utiliza-a para o seu discurso teológico, que diz
respeito à história da salvação.
A história da salvação
contém no seu interior um mistério.
O Apocalipse apresentará a
história como um livro secreto, fechado, um livro codificado, que só
o Cordeiro morto e ressuscitado tem a capacidade de decifrar (Ap
5,1-10).
No Gn 25,23 encontra-se uma
obscura profecia que respeita à rivalidade entre Esaú e Jacob.
O tema central do capítulo é a
bênção. A raiz do termo abençoar é citada 21 vezes (3X7),
números de plenitude. A expressão “que a minha alma te bendiga”
liga-se à antiquíssima concepção de bênção, vista como uma passagem
aos outros de uma força espiritual que age de modo mágico. É um acto
decisivo e irrevogável. É o bem tranquilamente esperado por Esaú e
astutamente insidiado por Jacob.
v. 1-2 Isaac estava
velho… e já não via. Chamou o filho mais velho Esaú…. Como vês,
estou velho e desconheço qual será o dia da minha morte. Isaac
sente a proximidade da morte e sabe que deve assegurar a
continuidade da linha patriarcal.
vv. 3-4 …tomas as tuas
armas, a alijava e o arco … traz caça … traz-me de comer para que te
bendiga antes de morrer. Resulta claro que se trata de uma
bênção testamentária, ligada ao direito de primogenitura. Isaac
comporta-se de maneira incorrecta, dá a bênção em privado num
contexto que parece ligado apenas ao subjectivo prazer dos sentidos.
Deveria ter dado a bênção na presença dos familiares e depois de ter
orado ao Senhor. Pagará as consequências de tal incorrecção.