Ano A 25 domingo tempo comum
XXV domingo do tempo comum
Autor: Luciano Manicardi
XXV domingo do tempo comum
Autor: Luciano Manicardi
Is 55,6-9; Sl 144,2-3.8-9.17-18; Fl 1,20-27; Mt 20,1-16
A declaração divina transmitida pelo profeta – “Os meus pensamentos não são os vossos pensamentos, os meus caminhos não são os vossos caminhos” (Is 55,8) – encontra uma exposição narrativa na parábola do evangelho segundo a qual os trabalhadores que laboraram uma só hora na vinha do patrão recebem um pagamento igual ao dos que o fizeram o dia inteiro. No escândalo sofrido pelos trabalhadores da primeira hora está toda a distância entre o pensar e o agir de Deus e o pensar e o agir dos homens.
Esta distância não descreve o capricho de Deus ou o seu arbítrio, mas a sua misericórdia. O que os trabalhadores da primeira hora contestam ao patrão é, de facto, ter dado aos últimos a chegar a mesma recompensa que a eles, que tinham aguentado o peso do dia inteiro de trabalho. Literalmente, eles dizem: “Estes últimos fizeram apenas uma hora e tu fizeste-os iguais a nós que suportámos o peso da jornada e o calor” (Mt 20,12). Fazer aos últimos como aos primeiros deita por terra as discriminações e privilégios. O Deus bíblico, com efeito, é o Deus da graça. Exprime bem este primado da misericórdia e da graça sobre as lógicas jurídicas um excerto da Catequese sobre a Santa Páscoa do Pseudo-João Crisóstomo: “Quem trabalhou desde a primeira hora, receba hoje o justo salário; quem veio depois da hora terça, dê graças e congratule-se; quem se juntou depois da sexta, não hesite: não sofrerá qualquer prejuízo; quem tardou até à nona, venha sem hesitar; quem apenas se juntou na undécima, não tema pelo seu atraso. O Senhor é generoso, acolhe o último como o primeiro, concede o repouso tanto a quem se juntou na undécima hora como a quem trabalhou desde a primeira. Faz mercê ao último como ao primeiro, concede o repouso a quem chegou na décima primeira hora como a quem trabalhou desde a primeira.”
O texto interpela-nos sobre o que está no centro da nossa vida com Deus: a relação ou a prestação? Conceber o seu serviço a Deus como prestação leva a medi-lo e a confrontá-lo com o serviço dos outros, entrando numa relação de competição. Se, ao contrário, há a relação com o Senhor, então também o peso da jornada de trabalho é “jugo suave e leve” (cf. Mt 11,30) e a bondade do Senhor para com todos é motivo de agradecimento, não de contestação.
É importante salvaguardar a distância entre pensamentos de Deus e pensamentos humanos porque impede a operação perversa de identificar os seus próprios pensamentos humanos com os de Deus. Esta afirmação contesta a presunção religiosa que projecta em Deus as suas próprias acções e os seus próprios pensamentos e identifica as suas próprias palavras sobre Deus com Deus, e a sua própria vontade com a de Deus. A instância expressa pelo profeta é um convite à humildade do pensamento, em particular do pensamento teológico, do pensamento que ousa “pensar Deus”.
Os trabalhadores da primeira hora são desmascarados como invejosos. E a inveja é definida como ter “o olho mau” (Mt 20,15). A etimologia é esclarecedora: in-videre, que significa “não ver”, “ver contra”, e exprime o olhar turvo de quem se pergunta: “porquê ele sim e eu não?”; “porquê a ele o mesmo que a mim que merecia mais?” A inveja cega-nos. Se esta é a impaciência em relação aos nossos próprios limites que nos impede de atingir aquele status que vemos realizado em outros de nós, ela pede para ser corrigida aprendendo a desejar o possível.
Na inveja, não só deixa de se ver o Deus misericordioso, mas também deixa de se ver mesmo os irmãos: entra-se numa relação jurídica patrão-servos, e sai-se da solidariedade com os outros trabalhadores, os outro homens.
Um mal da vida comunitária e eclesial é a murmuração (cf. Mt 20,11). Murmurando, os trabalhadores da primeira hora afirmam que o patrão não tinha o direito de comportar-se como se comportou. A murmuração não é uma palavra pessoal clara que exprime uma discordância leal, mas um movimento subterrâneo, que agrega diversas pessoas que se dão força mutuamente com o seu mau humor, para depois se exprimirem em acusações e queixas.
© – Luciano Manicardi