Ensina-nos, Senhor, a rezar este vazio. O vazio trazido por um medo que não conhecíamos e que agora parece um inquilino da nossa alma.
O vazio dos espaços em isolamento. O vazio da vida que se faz sentir como que suspensa. O vazio das horas que quem está na solidão conta de forma diferente.
O vazio das incertezas que se acumulam e das quais ainda não falamos. O vazio dos olhos de quem vemos sofrer e o vazio de muitos que sofrem sem que nós os vejamos. O vazio de tudo aquilo que, de um instante ao outro, é procrastinado.
O vazio daquela idosa que passa o dia inteiro com o rosto contra o vidro da janela. O vazio do refugiado que vê a sua esperança negada por um carimbo. O vazio do jovem diante de um futuro que escapa cada vez mais, como um pensamento distante.
O vazio que nos alcança como um aviso de despejo da vida autêntica. O vazio dos encontros e das conversas de que precisaríamos agora. O vazio que os amigos percebem. O vazio das risadas. O vazio de todos os abraços não dados. O vazio da proximidade proibida.
O vazio em que não te vemos.
José Tolentino Mendonça,
bibliotecário e arquivista do Vaticano, em artigo publicado em Avvenire, em 30 de outubro de 2020.
Tradução: Moisés Sbardelotto