“Nós tentámos dizer a nós próprios que progresso queria dizer crescimento e que crescimento significava bem-estar, mas o que a crise ambiental tem revelado é que o crescimento sem limites é a maior ameaça ao nosso bem- estar”. (George Monbiot)
Não por acaso o Papa Francisco escolheu o dia 1 de Maio (dia mundial do trabalhador) para lançar ao mundo um desafio profético: a concretização de um pacto mundial por uma economia que faz viver e não mata; uma economia diferente, que humaniza e que cuida da criação; uma economia que não exclui nem descarta pessoas e povos.
O apelo de Francisco convoca ao empenhamento de crentes e não crentes a “dar uma alma à economia”. Dirige-se, não especialmente a políticos, governantes ou a grandes instituições internacionais, mas, sobretudo, aos jovens que estudam economia e aos empreendedores dispostos a enveredar por uma nova economia (Pensei em convidar especificamente vocês, jovens, porque, com o vosso desejo de um futuro bom e feliz, vocês já são uma profecia de uma economia atenta à pessoa e ao meio ambiente).
Também não por acaso, o Papa Francisco escolhe Assis para lugar desta assembleia mundial, lugar símbolo de humanismo e fraternidade, que suscita e pressupõe uma radical conversão do olhar que inspira a cultura contemporânea e constitui o alicerce do actual paradigma da economia globalizada e financeirizada com o seu cortejo de disfuncionalidades que, presentemente, a caracterizam.
Assis, na visão do Papa Francisco, é o lugar certo para inspirar uma nova economia, pois foi ali que São Francisco se despojou de toda a mundanidade para escolher Deus como bússola da sua vida, tornando-se pobre com os pobres e irmão de todos. A sua decisão de abraçar a pobreza também deu origem a uma visão económica que permanece atual. Uma visão que pode dar esperança ao nosso futuro e beneficiar toda a nossa família humana, uma visão indispensável e urgente para salvaguardar o destino de todo o planeta,
A assembleia deverá reunir-se nos dias 24-28 Março 2020, mas, até lá, espera-se uma ampla mobilização das comunidades cristãs e suas instituições no sentido de construir as bases que poderão configurar uma nova economia.
Por detrás deste gesto profético do Papa Francisco, está toda a reflexão condensada na encíclica Laudato si – Sobre o cuidado da casa comum (diagnóstico de causas estruturais e proposta de caminhos para a sua superação) e para o indispensável e urgente empenhamento de crentes e não crentes em dar concretização a uma ecologia integral.
As Universidades em particular, mas também as empresas e as organizações da sociedade civil, são chamadas a ser laboratórios de esperança para criar novas formas de compreender a economia e o progresso, combater a cultura do desperdício, dar voz a quem não tem nenhuma e propor novos estilos de vida. Enquanto o nosso sistema económico-social ainda produzir uma vítima e houver mesmo que uma só pessoa descartada, não poderá haver a festa da fraternidade universal.
A este propósito, cabe lembrar algumas ideias mestras da LS que celebrou o quarto aniversário da sua publicação no passado dia 24 Maio:
– Tudo está intimamente conectado e a salvaguarda do ambiente não pode ser separada da justiça para com os pobres e da solução dos problemas estruturais da economia mundial. É necessário, portanto, corrigir os modelos de crescimento incapazes de garantir o respeito ao meio ambiente, o acolhimento da vida, o cuidado da família, a equidade social, a dignidade dos trabalhadores e os direitos das futuras gerações.
– O primado da economia sobre os demais valores da vida em sociedade é uma idolatria desumanizante e as comunidades dos fiéis devem promover novas formas de entender e organizar a economia à luz de uma ecologia integral, propondo formas de combater o desperdício e o descarte e suscitando novos estilos de vida pessoal e comunitária.
– O apelo à corresponsabilidade de cada pessoa humana pela sustentabilidade da nossa casa comum, não apenas em palavras e reconhecimento de princípios gerais, mas através de mudanças significativas nos estilos de vida de cada pessoa e das organizações, escrutinando os respectivos fins e meios de acção.
– A importância de uma espiritualidade assente na fé e na contemplação do Deus Criador do Universo, no qual somos apenas criaturas e não donos, a quem foi confiada a missão de cuidadores e não de exploradores em proveito próprio.
Queremos confiar em que a Igreja em Portugal não passará ao lado de mais este gesto profético do Papa Francisco e encontrará nele incentivo para tornar a encíclica Laudato si’ mais conhecida das comunidades cristãs (paróquias, congregações religiosas, organizações e movimentos) e, sobretudo, para empreender uma real conversão ecológica. Em particular, há que cuidar da “economia” que se ensina na Universidade Católica e da orientação que inspira a educação das novas gerações nos colégios católicos ou as aulas de moral católica no ensino oficial.