A personagem principal do
capítulo não é José, como poderá parecer, mas Adonai. Nos primeiros seis
versos o nome de Adonai é repetido cinco vezes. Adonai tinha dado aos
Patriarcas a promessa de bênção e aqui e agora começa a realizá-la. José
é apresentado como o novo Abraão, através do qual Adonai torna visível a
sua promessa de bênção para todas as nações, incluindo o Egipto ("em que
serão abençoadas todas as famílias da terra" Gn 12,3).
vv. 2-3Mas o Senhor estava com José... o seu amo viu que o Senhor estava com
ele e o Senhor fazia prosperar tudo o que empreendia. Estas duas
expressões são repetidas no final do mesmo capítulo, para dar a chave de
leitura para toda a passagem: Adonai está sempre com o seu fiel e
ajuda-o, especialmente quando se encontra num estado de opressão.
vv. 4-5Assim José encontrou graça aos seus olhos... entregou-lhe a
administração de todos os seus haveres... em casa e no campo.
José homem livre tinha-se tornado um escravo de Putifar, mas a bênção do
Senhor transforma-o num homem com todas as responsabilidades de um homem
livre. Para o autor, a rápida ascensão de José é milagrosa. A mensagem
implícita é:
O Senhor não livra das provas, mas quer exercitar o fiel
a ver a sua presença nas provas e a continuar a crer n’ele.
Para o crente as pegadas
do Deus invisível (Sl 77/76, 20) tornam-se visíveis.
vv. 6
O hagiógrafo é muito prolixo sobre a ‘beraka’, a bênção de Deus. É o
tema principal do capítulo.
vv. 7-8A mulher do amo… disse-lhe: une-te a mim! Mas ele recusou. A
tentativa de adultério realizada pela esposa do amo é um clássico da
literatura daquele tempo. Veja-se a a "história dos dois irmãos do Egito
(1500-1000 aC). Enquanto o marido está longe, a esposa do irmão mais
velho tenta seduzir o irmão mais novo, o benjamim, que se recusa. Quando
o marido regressa, a esposa mente e calunia o jovem, que, no entanto,
consegue justificar-se e a esposa é morta.
v. 9
Como cometeria eu esse grande mal, e pecar assim contra Deus?
José dá dois argumentos para rejeitar o adultério. O primeiro vem da
ética que decorre dos livros sapienciais, que valorizam as virtudes
humanas da educação, da justiça, da honestidade, da responsabilidade
moral, em que o adultério é o grande mal (Pr 2,16 - 19; 5,20-23;
6,20-29; c 7). O segundo argumento: o adultério transgride um
mandamento de Adonai. O adultério era considerado em Israel como um dos
crimes mais graves, havia a pena de morte (Ex 20:14, Lv 18,20, Dt
22,22). O pecado de adultério saía fora da esfera privada e
tornava-se pecado de toda a comunidade.
v. 12Ela agarrou-o pelo manto… mas ele abandonou-lhe o manto nas mãos e
fugiu… A história atinge o seu clímax com a fuga de José, que deixou
o manto, que era uma túnica tida como segura para toda a vida. O termo
manto, usado seis vezes em seis versos, o autor relaciona-o à
figura de José. A cena é descrita com muito realismo.
v. 14Olhai, introduziu em nossa casa um homem hebreu para nos escarnecer…
mas eu desatei em altos gritos. A mulher permanece numa situação
embaraçosa e pensa livrar-se dela caluniando José. A expressão
depreciativa homem judeu refere-se à primeira acepção da palavra
que, no Médio Oriente, se aplicava a um estado social muito espalhado
no Médio Oriente: aquele que nada tinha, muitas vezes a mercenários que
facilmente fomentavam rebeliões internas, e que eram sempre mal vistos.
Num segundo tempo, o termo judeu será usado pelos judeus para se
definirem na frente de estranhos (Gn 14,13; 40,15; Es 5,3; 7,16; Jonas
1,9). Na lista dos descendentes de Sem, cita-se um Eber (Gn 10,21.25)
como o progenitor dos judeus, já considerado um grupo étnico-político.
A palavra
escarnecer dos v. 14 e 17 indica o prazer erótico. A mulher mente
dizendo que gritou, porque sabe que isto a desculpará face aos juízes,
porque demonstra que não consentiu (Dt 22, 23-27) e assim poderá
ser subtraída à pena de morte. De facto, ninguém poderia ouvi-la gritar,
uma vez que no v. 11 especifica-se “não estava
nenhum dos empregados domésticos ”.
vv. 16-17
A mulher repetiu a história ao marido. Novamente José foi
caluniado.
vvt.
19-20
O amo... encheu-se de ira... e colocou-o na prisão. Esse final é
estranho porque o amo teria que matar José. Matavam-se os homens livres
quando cometiam adultério, tanto mais ele que era um escravo. Mas a
história de José deve continuar e as bênçãos de Deus também.
v 21
Mas o Senhor estava com José... e fez com que encontrasse graça aos
olhos do comandante da prisão. Putifar, amo
de José, devia ser o dono da prisão, na verdade prendeu-o, puniu-o, sem
pedir um julgamento público. É novamente retomado o tema dominante do
capítulo e de uma maneira incisiva. O Senhor está "com" o crente
injustamente oprimido e ajuda-o.
v. 22Assim o comandante da prisão confiou a José todos os preso… e não se
importava com nada... aquilo que ele fazia o Senhor tornava próspero.
O livro da sabedoria (Sb 10,13-14) recorda brevemente toda
esta senda de José e nela vê a presença de Deus que age segundo a sua
Sapiência.
O narrador
além de sublinhar o tema central da presença e das bênçãos de Deus, quer
realçar a figura de José como um modelo a seguir.
José è um homem sábio, capaz, temente a Deus, que nas
provas não se deixa desencorajar mas dá sempre o melhor de si.